terça-feira, 21 de fevereiro de 2012

ELAS TOMAM CONTA DE MIM

Esther
Moro em uma área bem central e num flat, aqui em Seul. Escolhemos morar em um apartamento menor, em troca de termos algumas facilidade que esse tipo de moradia proporciona. Temos café da manhã de hotel todos os dias, e uma camareira que arruma e limpa tudo, ela também troca lençóis e toalhas.  Escolhemos isso no lugar de um apartamento espaçoso em uma área residencial, por conta da praticidade e por estarmos perto de muito movimento, de restaurantes, bares, teatros. Os ganhos são extremamente compensadores, para alguém que leva um estilo de vida como o meu e do meu marido, e já que nossos filhos não estão mais conosco. 

Estamos aqui a pouco mais de 2 meses, e nesse tempo venho recebendo cuidados carinhosos da minha camareira. Ela é uma pessoa linda, fala algumas palavras em Inglês, mas fala muito com seus olhos, sorriso e com sua energia. Quero falar aqui sobre Esther, esse é o nome ocidental que ela escolheu para facilitar a nossa vida, já que os nomes coreanos nos são impossíveis.  Quero falar dessa mulher de quem não sei absolutamente nada, mas que já mora no meu coração, mas também quero falar sobre outras pessoas  que ela me lembra, pessoas que cuidam de mim.

Ter encontrado com essa mulher aqui me remete a tantas pessoas que tive na minha vida e que me ajudaram muito e por quem serei eternamente grata. Quando meus filhos eram bebês, tiveram uma babá que se chamava Selma, mas era a nossa Deda, forma como Caio ao começar a falar a chamou e que todos adotaram como sendo seu nome. Deda, cuidava dos meus filhos como uma leoa, era meio doidinha, mas era perfeita...amava meus filhos, brigava por eles e me ajudou tanto que não tenho como esquecer. Ela me deixou quando casou, meus filhos já não precisavam de uma babá, e eu mudara para uma casa distante para ela, mas nunca a esquecerei.
Nil sempre sorridente

Na minha casa tive como empregada doméstica duas pessoas queridas, Maria e depois Nil, essa segunda, terminou de criar meus filhos, enquanto eu trabalhava e fazia uma segunda faculdade. Nil cuidava da minha casa, de mim, dos meus filhos, cachorros e gato de forma tão especial que nem sabia como agradecer. Quando eu saia do meu quarto de manhã cedo para trabalhar, ela já me esperava com uma caneca de chá na mão e já encontrava meus filhos prontos para a escola. Ela fazia lista de supermercado e até ia fazer as compras pra mim. Nem sei como eu poderia ter me dedicado a tudo que fiz, se ela não existisse na minha vida. Sempre que volto ao Brasil, a vejo... choro de saudade de Nil e dos mimos que ela me fazia. Ela está casada agora e trabalha com amigos queridos.

Lu, Mari, Eloisio e Ane Rose
Na clínica (Espaço Mahatma Gandhi ) sempre tive Ane Rose e Marinalva que cuidavam de mim. Marinalva está comigo antes mesmo do meu segundo filho nascer e Ane surgiu quando eu mais precisava e não tinha ninguém para me ajudar, ela "vestiu a camisa" da minha clínica e abraçou com coragem e bravura minha causa... lutou comigo em períodos duros... não sei se teria feito o que fiz sem ela. Quando eu volto a Salvador, as duas estão lá me esperando... e me mimam. Juntaram-se a elas, mais duas pessoas queridas, Eloisio e Lucilene. Fico em paz sabendo que eles estão lá ajudando minha irmã a tocar a clínica enquanto eu ando pelo mundo.  


Sempre digo que acho que sou uma pessoa com muitos méritos por ter encontrado essas pessoas na minha vida. Nunca tive os problemas que a imensa maioria das pessoas, de perder funcionários, de estar sem babá, de ficar sem empregada. Sempre tive pessoas queridas, nas quais que eu podia confiar e me deixavam livre para cuidar do meu trabalho. Acho que tenho uma qualidade que ajuda essa relações, eu não me meto na forma como as pessoas fazem suas tarefas, nem quero saber; deixo todas as pessoas que trabalham comigo absolutamente livres para fazerem como quiserem seus trabalhos, não vigio, nem desconfio; sou grata e acho que eles podem errar, pelo simples fato de que são humanos. Sei que eles, assim como eu, temos nossos momentos de mau-humor e de estarmos "sem saco"pra fazer aquilo que temos que fazer.  

Gang Kang Suwollae
Quando mudei para os EUA vivi a experiência inédita de ter que cuidar de uma casa, tinha apenas uma faxineira que ia de 15 em 15 dias limpar a casa, e é claro que caí de amores por ela. Blanca, é de El Salvador, imigrante ilegal nos EUA. Uma mulher forte e determinada, que não falava uma palavra em Inglês. Nossa comunicação era formidável, pois eu não falo uma palavra em espanhol, mas mesmo assim chorei muito enquanto ela me contava sua história de imigração nos EUA e o quanto que ela sofreu na mão dos "coiotes" pra conseguir trazer os dois filhos, e soube também da imensa dor de perder uma filha nesse processo. Eu chorava e ela me consolava, dizia que ela tinha força para trabalhar, e que isso era o que importava. Ela me olhava com olhos amorosos, e eu sempre muito grata por tê-la ali comigo. 

Outro dia comprei um quadro aqui em Seul. Ele me encantou de cara, retratava doze mulheres dançando a luz de uma Lua Cheia. Como vocês sabem trabalho com Círculo de Mulheres, e adoro. Quando Esther viu meu quadro já na parede, tentou me explicar em Coreano, que se tratava de uma dança típica de mulheres que acontecia na primeira noite de Lua Cheia depois do Ano Novo Lunar. Ela explicou e até cantou algo que entendi que era uma cantiga de roda. Obviamente não entendi nada. Entretanto à noite, vi no jornal uma matéria sobre essa dança, porque coincidentemente aquela noite era a primeira Lua Cheia após o Ano Novo Lunar. Era a noite de dançar o "Gang Kang Suwollae", como se chama essa tradição. Entendi por que ela cantou a cantiga de roda para mim, entendi porque ela ficou tão alegre em ver o quadro...

Entendi, embora já soubesse...

... que ela é mais especial do que eu já sabia... 

... entendi que eu sou abençoada.

Esther também me disse que tenho "luck face", e que sempre terei na minha vida, pessoas para me ajudar. Ela me disse também que nunca estarei só.

Obrigada todas as pessoas lindas que entraram na minha vida e que tomam conta de mim, me mimam e não me deixam só.

Sou grata do fundo do meu coração.

Ludmila Rohr