quarta-feira, 25 de maio de 2016

O VLAD QUE EU CONHECI - O HERÓI E SUA SOMBRA (parte dois)


A adolescência começa a chegar para nós dois. Já temos mais duas irmãs. Nosso pai completamente envolvido com o sindicato, nossa mãe trabalhando em três turnos. Éramos uma família confusa. Não tínhamos dinheiro, vivíamos no mesmo pequeno apartamento, só que agora com mais duas irmãs, com idades tão distantes uma da outra, que adolescíamos, enquanto uma brincava e a outra era bebê. 

Tudo fica muito sombrio nessa época, nas nossas vidas. Meu pai absolutamente estressado com o sindicato, nossa mãe trabalhando em três empregos, nos virávamos não sei como. Foi então que a nossa relação fica muito, mas muito distante. Eu era aquela que tentava fazer tudo certo, que tentava não dar problemas, a chata. Vlad era individualista ao extremo. A socialização e a sexualização próprias da adolescência separou os dois irmãos. Eu o achava egocêntrico, egoísta, individualista... nos agredíamos mutuamente. Ele envolve-se com drogas, eu com yoga e meditação. Os dois buscam saídas.... fugas, sublimações....caminhos alternativos...a realidade era demais.




Eu tinha minhas amigas, ele tinha os amigos dele. Claro que ele tinha muito mais amigos, ele era popular, e carismático. Confesso que eu sentia ciúmes dele. Continuava a ser a "irmã de Vlad", e isso que antes me confortava, agora me enlouquecia. Brigávamos por tudo. Não tínhamos privacidade, não tínhamos espaços individuais, não tínhamos um bordo que nos amparasse nesse momento de conflito. Nossos pais não tinham olhos para o quão bélicos estávamos. Os conflitos foram sendo diários e desgastantes, mas vejo que não houve qualquer interferência para nos ajudar na época. Meu irmão da infância, já não existia. Sentia uma tristeza disfarçada pela raiva.


Mas desse fase das nossas vidas quero contar algumas histórias que não devem morrer comigo, e que quem o conheceu adulto, com certeza merece saber. Nesse post, contarei uma memorável.

Estudávamos no mesmo Colégio, ele um ano na minha frente. Quando ele terminou o terceiro ano, fez vestibular para Economia na Universidade Federal da Bahia, e passou. Para mim, restava ainda um ano de escola até que eu fizesse vestibular também. Bom, preciso contar que sou de Humanas, odiava com todas as minhas forças matérias como matemática e Física. Na verdade, eu não as odiava, mas adoraria que elas fossem ensinadas em português ao invés de russo. Vlad era bom em tudo, exceto em artes. Na quarta unidade do terceiro ano, eu precisava tirar 14 em física, isso significava que eu iria direto para a recuperação se não tirasse uma boa nota nessa prova. Eu não sabia nada, mas em minha defesa, preciso lembrar-lhes que o professor dava aula em russo, pelo menos para mim era assim que parecia. 

Então, vamos para a prova. Vlad, como ex-aluno do colégio, era fiscal de provas, mas não da minha sala obviamente. Eu estava na sala, com mais uns 60 outros alunos do colégio, e olhava a prova sem entender nada, costumo não perder tempo com o que não sei, não sou daquelas que acredita em milagres, e sempre tive total consciência do que sei e do que não sei, então em 10 minutos a prova já estava quase toda marcada, e eu estava prestes a passar os "chutes" para o gabarito, quando vejo Vladimir entrar na minha sala, ele pede licença para o fiscal e troca de lugar com ele, o fiscal sai, ele caminha na minha direção, eu imediatamente começo a tremer, e com a voz retumbante dele, coloca um papel na minha mesa e diz em alto e bom tom: "ISSO É PRA VOCÊ NUNCA DIZER QUE EU NÃO TE DEI NADA!!". Chama o fiscal da sala de volta, e sai.

Era o gabarito, ele havia respondido a prova pra mim. Tirei 10, mas a sala toda também tirou, porque eu passei o crime adiante, não queria testemunhas, queria cúmplices. 

Mas claro que o crime nunca é perfeito. Alguém que estudou nos denunciou. Babaca!!! Jurei de pé junto que não sabia de nada e que isso era invenção dos maledicentes, apesar do meu 10 destoar das notas do ano todo que não chegavam a 5. Toda a sala jurou que nada houvera naquele dia. Todos inocentes. Vlad perdeu o "emprego" , mas entrou definitivamente para a história do Colégio Alfred Nobel. 

No próximo post vou contar no acidente que quase o matou e o deixou em coma com traumatismo craniano, além de parar Salvador. 

continua....

5 comentários:

  1. Massa demais.Tinha que ter convivido com ele,repito.

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  2. E ele sempre ajudando... lembro-me de quando alguns alunos entregavam a prova pra ele, ele lia e dizia naquele sotaque gostoso de ouvir: "volte aqui miserável, você não falou sobre isso ou aquilo, vá lá, escreva!" Ou quando mesmo antes durante a prova ele ficava falando e falando e falando sem parar, nos pedíamos pra ele ficar quieto pra que pudéssemos nos concentrar... ele ria e dizia que não conseguia se calar... cantava...kkkkkkk inesquecível!

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  3. Muito linda esta declaração de amor ....com certeza para sempre❤❤❤❤

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  4. Lindo, obrigada por nos proporcionar parte da sua vida que desconhecemos, linda de ler e imaginar ele nas situações.!!!!!

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